sexta-feira, 6 de maio de 2011

Por que existe o sofrimento?

Por CS Lewis

Minha própria experiência é mais ou menos a seguinte. Estou progredindo ao longo da estrada da vida em minha condição usual, satisfeita e decaída, absorvido num encontro agradável com amigos marcado para amanhã ou um pouco de trabalho que estimula minha vaidade hoje, um feriado ou um livro novo, quando de repente uma pontada no abdome que pode indicar doença séria, ou uma notícia nos jornais ameaçando o mundo de destruição, faz ruir o meu castelo de cartas. Sinto-me a princípio vencido, com todas as minhas pequenas alegrias desfeitas como brinquedos destroçados. A seguir, devagar e com relutância, pedaço a pedaço, tento enquadrar-me no estado de espírito em que deveria sempre estar.

Chamo minha atenção para o fato de que todos esses brinquedos não tinham o propósito de apossar-se do meu coração, que meu bem real está num outro mundo e que meu único e verdadeiro tesouro é Cristo. E, talvez, pela graça de Deus, venha a ter êxito, e durante um dia ou dois me torno uma criatura que depende conscientemente de Deus e que extrai a sua força das fontes certas. Mas no momento em que a ameaça desaparece, toda a minha natureza salta de volta aos brinquedos: fico até ansioso, que Deus me perdoe, para banir de minha mente a única coisa que me sustentou sob a ameaça, porque ela está agora associada à miséria daqueles poucos dias.

Fica então muito clara a terrível necessidade da tribulação. Deus me teve apenas por quarenta e oito horas e mesmo assim à força de ameaças, de tirar de mim tudo o mais. No momento em que Ele embainha a espada, me comporto como um cachorrinho quando o odiado banho acaba – sacudo-me o melhor que posso e corro a recuperar minha confortável sujeira, se não for no monturo mais próximo, pelo me nos no primeiro canteiro de flores. É por isso que as tribulações não podem cessar até que Deus nos veja transformados ou julgue que nossa transformação é agora impossível.

Um comentário:

  1. O hedonismo realmente nos afasta do divino, de tudo o que é transcendente. Sobre o sofrimento eu tenho muito mais perguntas do que respostas, muito mais ... Lembrei de uma frase do Lewis que me acompanha por muito tempo: "O melhor talvez seja aquilo que menos entendemos".

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